Não era o Felipão, sentado ali, na casa-mata. Mas sim um franzino velhinho, quase careca e grisalho, mas de vistoso passado. E claro, algumas figuras do passado já não habitavam o tapete verde entre as quatro linhas, como Aílton, Adílson Baptista e Jardel. Mas era definitivamente o Grêmio, com seu inconfundível uniforme tricolor, em negro, azul e branco.
"Para ganhar do Grêmio, um time precisa ser mais técnico e mais competitivo. Se não for as duas coisas, no máximo empata. Ganhar, não ganha."
Fernando Calazans, do jornal O Globo
O Flamengo havia empatado, em Porto Alegre, e para muitos a brilhante fase que se iniciara ainda em 1993, com a contratação de Luiz Felipe Scolari - e a montagem de um time competitivo como poucas vezes se viu - estava encerrada. Como o confronto decisivo seria no Maracanã, a crença geral era de que o Grêmio precisava fazer resultado na primeira partida para ambicionar o título. Ainda jogaria desfalcado de um de seus maiores expoentes, Dinho, expulso no jogo de ida. Convém lembrar que o Flamengo jamais havia perdido um título dentro do Maracanã para uma equipe de fora do Rio. O otimismo pulsava nas veias flamenguistas.
Eram os tempos do "Ahh, eu tô maluco", grito que tomou conta das torcidas do Nordeste e Sudeste do país. Aqui, na ponta do mapa, ainda era época de bairrismo. E assim gritava a torcida rubro-negra, "ahh, eu tô maluco". A festa estava montada, com quase cem mil torcedores de vermelho e preto no Estádio Jornalista Mário Filho. Na pequena torcida tricolor que se fez presente, o atual "dale" ainda era o "dá-lhe" ou o "não te mixa", muito mais Gaúcho do que Castelhano, vale dizer...
O jogo, claro, iniciou tenso, mas logo aos 6 minutos o Grêmio mostras suas armas. João Antônio recebe passe de Carlos Miguel, dentro da área, dribla o zagueiro e bate no canto. Grêmio 0x1. O Flamengo precisava sair para o jogo, pois o empate não mais servia, era preciso virar a partida, e os contra-ataques levavam o pavor para as hostes urubus. Em três lances, com Paulo Nunes, Arce e Carlos Miguel, a bola rondou a goleira rubro-negra. O primeiro chute flamenguista somente ocorreu aos 25 minutos, com um então menino Athirson. Sávio, a grande contratação do Flamengo para o ano, sai lesionado, para a entrada de Lúcio, que empataria aos 30 minutos, recebendo livre, e batendo depois de dominar. O Flamengo se inflamava, e aquele jogo morno que parecia levar, inexorávelmente, à derrota no torneio, ficava para trás. A virada parecia questão de tempo, e chegou com o baixinho, de cabeça. Antecipou-se à Luciano, que substituíra Rivarola, e na segunda tentativa, empurrou para o gol livre.
Mais do que nunca, o canto de "Ahh, eu tô maluco" tomava conta do estádio. Precisando do resultado, mas enfrentando um adversário qualificado, empurrado por uma centena de milhar de seus torcedores, o Grêmio retornaria do intervalo disposto à ser ainda mais valente, e de fato precisaria sê-lo para sonhar com o Tri-Campeonato da Copa do Brasil. Logo aos 3 minutos, a bola enflexada pela cabeça de Luciano encontraria a trave em seu caminho.Apenas alguns instantes depois, Romário quase faz o terceiro, após cruzamento de Athirson.
O jogo fica truncado, e cada minuto parecia jogar contra os tricolores. Até que aos 34 minutos da segunda etapa Roger busca uma bola esticada na esquerda. O cruzamento ainda desvia na defesa, encontrando os pés de Carlos Miguel, e depois... a rede. Os gritos de "Ahh, eu tô maluco", e até mesmo de "Dá-lhe Grêmio" e de "Não Te Mixa, Grêmio", foram largamente abafados por uma gloriosa paródia... "Ahh, Eu Sou Gaúcho" toma conta do estádio...
Os minutos finais da partida agora pareciam ser todos gremistas, e estavam determinados à dar razão às palavras de Calazans. Pouca coisa de valor aconteceu naqueles derradeiros momentos, e o time tricolor mostrou valor naquilo que sabia fazer com maestria. Jogar com o Regulamento debaixo dos braços.
O velhinho na Casa-Mata não era mais Felipão, e isso representaria sem dúvida o Canto do Cisne daquele Grêmio. Mas mais uma vez heróico, o Grêmio quebrava outro tabu. Pela primeira vez em quase cinqüenta anos o Flamengo perdia um título dentro do Maracanã para um time de fora do Rio.
Reportagem do Jornal Nacional
Jogo Completo.
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