Artigo de opinião publicado no O Estado de São Paulo, dia 26 de Agosto de 2012.
"Os políticos e as fraldas devem ser ser freqüentemente trocados, e pelo mesmo motivo"
Eça de Queiroz
A transparência e constante fiscalização são fundamentais para uma sólida democracia. Quando alguém ou algo toma para si um poder quase absoluto, aí reside o perigo para a democracia. No Brasil, este perigo está traduzido em duas situações: a compra de antigos rivais políticos e aparelhamento do estado, e a politização do judiciário.
Dos 11 ministros, 8 foram indicados ou por Lula ou por Dilma, e não é de hoje que tomaram decisões ideologizadas. Um dos casos recentes foi a decisão sobre Cotas Raciais. O Estadão publicou um artigo de Opinião importante pela liderança em publicar o que poucos têm coragem para fazer. O poder absoluto do PT e de seus comparsas comprados é um perigo ao país. Veja porque.
"No julgamento do mensalão o Supremo Tribunal Federal (STF) está
decidindo a sua sorte. Mas não só: estará decidindo também a sorte da
democracia brasileira. A Corte deve servir de exemplo não só para o
restante do Poder Judiciário, mas para todo cidadão. O que estamos
assistindo, contudo, é a um triste espetáculo marcado pela
desorganização, pelo desrespeito entre seus membros, pela prolixidade
das intervenções dos juízes e por manobras jurídicas.
Diferentemente do que ocorreu em 2007, quando do recebimento do
Inquérito 2.245 - que se transformou na Ação Penal 470 -, o presidente
Carlos Ayres Britto deixou de organizar reuniões administrativas
preparatórias, que facilitariam o bom andamento dos trabalhos. Assim,
tudo passou a ser decidido no calor da hora, sem que tenha havido um
planejamento minimamente aceitável. Essa insegurança transformou o
processo numa arena de disputa política e aumentou, desnecessariamente, a
temperatura dos debates.
Desde o primeiro dia, quando toda uma sessão do Supremo foi ocupada
por uma simples questão de ordem, já se sinalizou que o julgamento seria
tumultuado. Isso porque não interessava aos petistas que fosse tomada
uma decisão sobre o processo ainda neste ano. Tudo porque haverá
eleições municipais e o PT teme que a condenação dos mensaleiros possa
ter algum tipo de influência no eleitorado mais politizado,
principalmente nas grandes cidades. São conhecidas as pressões contra os
ministros do STF lideradas por Luiz Inácio Lula da Silva. O
ex-presidente agiu de forma indigna. Se estivesse no exercício do cargo,
como bem disse o ministro Celso de Mello, seria caso de abertura de um
processo de impeachment.
A lentidão do julgamento reforça ainda mais a péssima imagem do
Judiciário. Quando o juiz não consegue apresentar brevemente um simples
voto, está sinalizando para o grande público que é melhor evitar
procurar aquela instância de poder. O desprezo pela Justiça enfraquece a
consolidação da democracia. Quando não se entende a linguagem dos
juízes, também é um mau sinal. No momento em que observa que um processo
acaba se estendendo por anos e anos - sempre havendo algum recurso
postergando a decisão final - a descrença toma conta do cidadão.
Os ministros mais antigos deveriam dar o exemplo. Teriam de tomar a
iniciativa de ordenar o julgamento, diminuir a tensão entre os pares,
possibilitar a apreciação serena dos argumentos da acusação e da defesa,
garantindo que a Corte possa apreciar o processo e julgá-lo sem
delongas. Afinal, se a Ação Penal 470 tem enorme importância, o STF
julga por ano 130 mil processos. E no ritmo em que está indo o
julgamento é possível estimar - fazendo uma média desde a apresentação
de uma pequena parcela do voto do ministro Joaquim Barbosa -, sendo
otimista, que deverá terminar no final de outubro.
Esse julgamento pode abrir uma nova era na jovem democracia
brasileira, tão enfraquecida pelos sucessivos escândalos de corrupção. A
punição exemplar dos mensaleiros serviria como um sinal de alerta de
que a impunidade está com os dias contados. Não é possível considerarmos
absolutamente natural que a corrupção chegue até a antessala
presidencial. Que malotes de dinheiro público sejam instrumento de
"convencimento" político. Que uma campanha presidencial - como a de
Lula, em 2002 - seja paga com dinheiro de origem desconhecida e no
exterior, como foi revelado na CPMI dos Correios e reafirmado na Ação
Penal 470.
A estratégia do PT é tentar emparedar o tribunal. Basta observar a
ofensiva na internet montada para pressionar os ministros. O PT tem uma
vertente que o aproxima dos regimes ditatoriais e, consequentemente, tem
enorme dificuldade de conviver com qualquer discurso que se oponha às
suas práticas. Considera o equilíbrio e o respeito entre os três Poderes
um resquício do que chama de democracia burguesa. Se o STF não condenar
o núcleo político da "sofisticada organização criminosa", como bem
definiu a Procuradoria-Geral da República, e desviar as punições para os
réus considerados politicamente pouco relevantes, estará reforçando
essa linha política.
Porém, como no Brasil o que é ruim sempre pode piorar, com as duas
aposentadorias previstas - dos ministros Cezar Peluso, em setembro, e
Ayres Britto, em novembro - o STF vai caminhar para ser uma Corte
petista. Mais ainda porque pode ocorrer, por sua própria iniciativa, a
aposentadoria do ministro Celso de Mello. Haverá, portanto, mais três
ministros de extrema confiança do partido - em sã consciência, ninguém
imagina que serão designados ministros que tenham um percurso
profissional distante do lulopetismo. Porque desta vez a liderança
petista deve escolher com muito cuidado os indicados para a Suprema
Corte. Quer evitar "traição", que é a forma como denomina o juiz que
deseja votar segundo a sua consciência, e não como delegado do partido.
Em outras palavras, o STF corre perigo. E isso é inaceitável.
Precisamos de uma Suprema Corte absolutamente independente. Se, como é
sabido, cabe ao presidente da República a escolha dos ministros, sua
aprovação é prerrogativa do Senado. E aí mora um dos problemas. Os
senadores não sabatinam os indicados. A aprovação é considerada
automática. A sessão acaba se transformando numa homenagem aos
escolhidos, que antes da sabatina já são considerados nomeados.
Poderemos ter nas duas próximas décadas, independentemente de que
partido detenha o Poder Executivo, um controle petista do Estado
brasileiro por intermédio do STF, que poderá agir engessando as ações do
presidente da República. Dessa forma - e estamos trabalhando no terreno
das hipóteses - o petismo poderá assegurar o controle do Estado,
independentemente da vontade dos eleitores. E como estamos na América
Latina, é bom não duvidar."
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